TÁTICAS PARA
DIZER NÃO!
Texto de Igor Vamos
A dupla Yes Men já se passou por representante de grandes empresas, porta-voz de governos, auxiliar de ministros, já produziu uma edição falsa do jornal The New York Times e fez as ações de uma grande empresa caírem bilhões em poucos minutos. Neste texto, produzido para Piseagrama, Igor Vamos relata como se encontrou com Jacques Servin e relembra algumas de suas histórias de ativismo.
Cresci no subúrbio de uma cidade norte-americana dominada por cadeias de lojas e, quando ainda era estudante secundarista, achava divertido perturbar os negócios destas lojas com meus amigos. Estávamos no começo dos anos 1980 e, vestidos de piratas, íamos a restaurantes fast food de frutos do mar e exigíamos comida de graça. Entrávamos em shopping centers com um de nós gritando dentro de uma mala arrastada pelo outro. Na seção de brinquedos, trocávamos as caixas sonoras dos bonecos falantes e os colocávamos de volta às prateleiras, de forma que Barbies passavam a dizer “Homens mortos não contam mentiras” e Falcons diziam “Eu amo fazer compras com você”. Assumíamos, logo depois, a autoria do crime como uma ação da Organização de Libertação das Barbies.
Nos Estados Unidos daquele tempo, não havia demasiada preocupação com o terrorismo. A polícia podia até ser acionada diante daquelas situações, mas não corríamos o risco de levar um tiro, algo bem provável de acontecer se fizéssemos ações daquele tipo nos dias de hoje. Mas apenas mais tarde dei-me conta de que tais atividades que realizávamos tinham um conteúdo político. Eram uma espécie de rebelião contra a cultura do consumo e contra a busca implacável pelo enriquecimento que, em um mundo cada vez mais globalizado, seguem ditando os próximos passos da cultura hegemônica.
Conheci Jacques Servin por meio da internet. Ele tinha acabado de fazer uma ação parecida com as minhas, atuando como hacker de um jogo de videogame. Jacques trabalhava na ocasião para a companhia Maxis, que produzia jogos como o The Sims. Ele era um dos programadores da companhia e, certo dia, resolveu infiltrar conteúdos extras no jogo SimCopter: personagens gays que apareciam subitamente no jogo e, de sunga, abraçavam-se e beijavam-se. Vendo aquilo, percebi que teríamos uma conexão imediata.
Começamos a trabalhar juntos por volta de 1997, no coletivo de ativistas RTMark, espécie de corporação anticorporação. Ali, vislumbramos a hipótese de criar o The Yes Men quando percebemos que poderíamos, sem muitas dificuldades, fingir ser pessoas importantes que seriam infiltradas em reuniões de negócios.
O que pretendíamos fazer em tais reuniões era provocar um espelho, um reflexo que ampliava ao absurdo as ideias das pessoas que frequentavam aqueles ambientes. Seríamos uma versão hiperinflada de quem quer que fôssemos encontrar. Se o encontro fosse com neoliberais, seríamos ainda mais neoliberais que estas pessoas. Em todas as situações, teríamos sempre o ímpeto de dizer: Yes! E o nome The Yes Men nos pareceu perfeito para nomear o que planejávamos fazer.
Essa expressão tem um duplo significado em inglês. Um yes man, aquele homem que só concorda, é também um “puxa-saco” ou “lambe cu”, alguém que apoia o patrão mesmo que ele tenha as ideias mais terríveis, só para agradá-lo. A grande vantagem do termo yes man é que não se trata de um palavrão e, sim, de algo que pode ser dito em qualquer situação, sem precisar tirar as crianças da sala. Como exemplo, poderíamos dizer que Donald Trump se cerca hoje dessa espécie dos yes men – e talvez só assim ele se sinta melhor consigo mesmo.
Quando ainda participávamos da RTMark, mantínhamos nossas identidades secretas porque tínhamos que proteger outras pessoas que também faziam parte do grupo e tentávamos, assim, dificultar o ataque que vinha das corporações em reação às nossas ações. Nos primórdios do The Yes Men, chegamos a criar nomes fictícios para nós: Andy Bichlbaum e Mike Bonanno. Mas o que não percebemos naquela época é que poderíamos muito bem ter usado nossos nomes reais, pois os nomes fictícios não ajudavam muito. Pelo contrário, eles só confundiam as coisas, porque sempre que nos infiltrávamos em algum outro evento, tínhamos que inventar novos nomes. Mais tarde, já como The Yes Men, o ataque às corporações passou a ser uma de nossas metas.
A história do The Yes Men começou quando fizemos um site falso para a Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1999. O site era uma sátira – naquele momento participávamos do movimento antiglobalização – mas, mesmo assim, algumas pessoas que provavelmente não leram com atenção o que estava escrito na tela pensaram que era um site real e começaram a nos procurar. Em parte, isso aconteceu também porque em Seattle, na ocasião das manifestações contra a OMC, o diretor da OMC havia concedido uma declaração especial à imprensa denunciando nosso site. Como o espírito daquele tempo pressupunha estar na internet e a primeira bolha da internet ainda não tinha estourado, era muito fácil fazer sites falsos. Assim, a denúncia do diretor da OMC ajudou a nos arremessar para o topo dos resultados de busca.
Dentre as buscas pela OMC que eram então direcionadas para nosso site, algumas resultavam em mensagens de pessoas que procuravam um representante da organização para falar em eventos, conferências ou reuniões. Começamos então a responder esses e-mails e aceitar os convites, apresentando a seguinte ressalva: “Como não podemos enviar o diretor geral, enviaríamos seu substituto, o Dr. Andreas Bichlbauer”. Bichlbauer foi um nome que encontramos ao acaso na lista telefônica de Viena.
Em nosso primeiro evento como representantes da OMC, na Áustria, proferimos um discurso ridículo, um reflexo perfeito do que pensávamos sobre a filosofia política e a agenda de seus dirigentes. Uma espécie de comédia para quem estivesse presente, uma forma de ridicularizar a agenda econômica neoliberal da OMC. Filmamos o evento e disponibilizamos o vídeo, que foi bem recebido pela imprensa. O The New York Times publicou artigos a respeito. Nos anos seguintes, ainda atuávamos como “representantes” da OMC. Filmamos praticamente todas as nossas ações e, com este material, fizemos nosso primeiro filme, The Yes Men, em 2003.
No último evento da OMC em que participamos, uma conferência na Austrália, decidimos fazer algo mais drástico. Anunciamos que a OMC iria fechar as portas e que seria substituída por uma nova organização, a Organização de Regulação do Comércio (ORC), que colocaria o comércio a serviço dos pobres e do meioambiente. Qualquer decisão comercial dali em diante teria que passar por um conselho composto pelas pessoas envolvidas – aquelas que geralmente não têm o poder de decisão. Ou, ainda, o conselho seria composto não só pelas pessoas desprovidas de poder, mas também pelo meio ambiente – os animais e os vegetais. O conjunto desses novos atores conduziria as tomadas de decisão e regularia o comércio internacional.
O público era basicamente formado por economistas e contadores de alta competência. Pessoas que eram especialistas em esconder o dinheiro das grandes corporações em paraísos fiscais. Entretanto, surpreendentemente, todos ficaram empolgados com a notícia. Sentiram que poderiam trabalhar com a nova estrutura, seria um novo desafio. Se as regras mudassem, eles ficariam felizes em descobrir como continuar ganhando dinheiro no novo contexto proposto.
Percebemos a lógica instalada: as pessoas vão a essas conferências para encontrar certas pessoas. Éramos, na maioria das vezes, apresentados como as pessoas mais importantes da sala, os reguladores da OMC ou, digamos, o chefe do Departamento de Moradia e Desenvolvimento Urbano de Nova Orleans, logo depois do furacão Katrina. As pessoas importantes que fingíamos ser – algumas completamente inventadas e outras baseadas em pessoas reais – eram exatamente as pessoas que o público ali presente buscava encontrar. Éramos as pessoas com quem sonhavam trocar um cartão de negócios e, mesmo que disséssemos algo completamente insano, eles ainda viriam atrás de uma troca de cartões.
A última cena de um de nossos filmes, The Yes Men are revolting, feito em 2014, registra uma conferência do Departamento Nacional de Segurança na qual anunciamos que os Estados Unidos iriam proibir todos os combustíveis fósseis até 2030 e que haveria uma força tarefa para mudar a matriz energética. A energia produzida seria toda renovável e ficaria sob o controle dos povos indígenas dos Estados Unidos. Ainda assim, diante da revolucionária notícia, ao final todos os presentes vieram até nós para pegar um cartão – pessoas que trabalhavam inclusive como prestadoras de serviço para o Departamento de Defesa dos EUA!
Sabemos que, em parte, há uma razão psicológica para isso. Quando estão em grupo, as pessoas ficam menos propensas a objetar. Há também algo que nos faz lembrar da famosa experiência desenvolvida pelo psicólogo Stanley Milgram na década de 1960, em que alguém que está em posição de autoridade pode dizer qualquer coisa e as pessoas vão concordar só porque se trata de uma pessoa em posição de autoridade.
No período após o ataque de 11 de setembro de 2001, as coisas ficaram um pouco estranhas para o movimento antiglobalização e tivemos que mudar nossa tática. As pessoas passaram a ser mais policiadas e de maneiras diferentes. O temor da violência fez com que o movimento antiglobalização passasse a receber a desconfiança de cada vez mais pessoas na Europa e nos Estados Unidos. Começamos então a trabalhar com organizações menores e grupos locais, pessoas que dedicavam suas vidas a campanhas e objetivos específicos. Tínhamos como diretriz ser mais granulares na abordagem política para provocar mudanças, como no caso da Union Carbide.
Nos idos de 1984 havia ocorrido em Bhopal, na Índia, o maior acidente industrial da história. Uma enorme catástrofe na qual cerca de 8 mil pessoas morreram e mais de 500 mil pessoas foram expostas a um gás altamente tóxico que vazou da indústria de produtos químicos Union Carbide. O acidente estava anunciado, muitas pessoas tinham conhecimento do enorme risco que a região corria. Um jornalista havia previsto o fato por meio de uma série de artigos e uma petição pública com o intuito de desativar a fábrica. Apesar de desde sempre ciente do alto risco, a Union Carbide ao final conseguiu livrar-se das acusações de assassinato e nunca pagou as devidas indenizações para as vítimas. Houve decerto um acordo, mas que acabou não sendo cumprido. O diretor executivo da companhia fugiu da Índia e aposentou-se em Long Island, nos Estados Unidos. Uma história que pode ter muitas semelhanças com a recente ruptura de barragens da mineradora Vale, em Minas Gerais, no Brasil.
Quando a empresa Dow Chemical comprou a Union Carbide em 2001, os ativistas e as vítimas da catástrofe – que vinham lutando há anos por compensações, reconhecimento, limpeza e recuperação do local da fábrica – queriam garantir que a Dow Chemical assumiria a responsabilidade pela tragédia. A comunidade atingida habitava, como herança, um coração de lixo tóxico e queria que, quando as pessoas ouvissem o nome “Dow”, isto surtisse os mesmos efeitos de quando ouviam “Union Carbide”. Se a Union Carbide era associada à responsabilidade pelo desastre, agora as pessoas saberiam que a Dow seria sua substituta.
Ativistas do Greenpeace parceiros dos envolvidos em Bhopal nos procuraram. Pediram para que construíssemos um site falso, à maneira como havíamos feito para a OMC anos antes. E a história se repetiu. Foram publicados, novamente, alguns artigos em jornais importantes como The New York Times. No início do século XXI, ainda era fácil publicar sites falsos e torná-los populares. Por dois anos o site ficou no ar, até que recebemos um e-mail em 2004. Jornalistas da BBC buscavam algum representante da Dow Chemical para se pronunciar sobre o vigésimo aniversário do desastre de Bhopal.
Fomos assim convidados para participar de um dos programas de jornalismo mais assistidos do mundo. Anunciamos ao vivo, na televisão, que a Dow Chemical, depois de todos aqueles anos, finalmente assumiria a responsabilidade pela catástrofe de Bhopal e faria um desembolso da ordem de 12 bilhões de dólares para o ressarcimento das vítimas e a reestruturação do lugar. Dessa vez, o anúncio caiu como uma bomba. As ações da Dow Chemical na bolsa de valores caíram 2 bilhões de dólares em apenas 20 minutos.
Nos Estados Unidos, onde fica a sede da Dow Chemical, fomos citados em mais de 600 artigos impressos e em outros milhares ao redor do mundo. A tática de fazer pronunciamentos positivos e inesperados é eficaz porque força a companhia a reagir rápido. Trata-se do que os ativistas sérvios do grupo Otpor! chamariam de “ação dilema”: a construção de uma situação em que seu movimento deixa o oponente sem nenhuma possibilidade razoável de movimento em resposta. Qualquer coisa que o oponente faça vai dar errado. Se dizem que o anúncio é falso, estão assumindo que não vão se responsabilizar pelo acidente, o que é polêmico; tampouco podem assumir o anúncio, pois teriam que assim arcar com as consequências reais.
A partir de ações desse tipo nasce o filme The Yes Men fix the world (2009). Enquanto esse filme documenta as ações em conjunto com organizações focadas em questões específicas, em The Yes Men are revolting (2014) atuamos como consultores independentes para as organizações, treinando seus integrantes para que pudessem, eles mesmos, fazer as ações. Assim surgiu o “Yes Lab”, um laboratório que mistura escola com treinamento prático, sob a ideia de espalhar e compartilhar as táticas que usamos.
Quando começamos a fazer nossas ações, muitos nos desaconselhavam e previam que teríamos problemas. Mas os problemas raramente aconteciam, como viemos a descobrir com o passar do tempo. Não havia como saber sem fazer. Temos consciência de que esse cenário só acontece porque somos homens brancos em países ricos. É muito grave constatar isso, mas corremos menos riscos com nossas ações de desobediência civil do que um afro-americano que simplesmente caminha pelas ruas ou uma transexual vestida como bem entende. Outros corpos estão muito mais suscetíveis a sofrer violência urbana do que nós, infelizmente.
A maioria de nossas ações teve lugar nos Estados Unidos e na Europa, países com leis de liberdade de expressão que nos garantiam o direito de fazer o que fazíamos; países que cumprem de modo relativamente decente as leis, sobretudo se você está usando um terno. Além de sermos homens brancos, sabemos que se aparentássemos ser homens de negócios, seria bastante improvável que algo ruim nos acontecesse, até mesmo em certos lugares onde policiais têm o hábito de agir violentamente.
Uma vez, seguranças nos trancaram em uma sala. Estávamos atuando duplamente como representante da EXXON Mobile e representante do governo americano em uma conferência sobre petróleo no Canadá, em 2007. A polícia foi acionada e os policiais, sem os seguranças por perto, nos perguntaram: “O que está havendo, pessoal?”. Simplesmente contamos a verdade. Eles acharam tudo muito divertido e prometeram nos tirar dali. “Vamos conversar com os caras, mas pode demorar. Podemos trazer uma xícara de café porque vocês provavelmente vão ficar aqui por algum tempo enquanto descobrimos o que fazer.”
Os policiais nos trouxeram bebidas enquanto esperávamos que tranquilizassem a situação! Mas os seguranças estavam incontornáveis e os policiais sugeriram uma estratégia de fuga: “Os caras lá fora estão muito bravos, então agradeceríamos se vocês saíssem parecendo carrancudos e soturnos, como se tivessem levado um sermão. Nós vamos levar vocês para casa, mas ajam como se estivéssemos prendendo vocês”. Agimos como o combinado, exibindo nossas caras sérias, entramos no carro da polícia e ganhamos uma carona.
Dois anos depois, quando fomos processados pela Câmara de Comércio dos Estados Unidos, uma companhia privada cuja verdadeira função é fazer lobby no governo para impedir regulações ambientais, o processo foi ótimo para nós. Havíamos anunciado, atuando como seus representantes, que apoiaríamos uma nova legislação sobre a mudança climática. O anúncio se tornou viral e foi exibido ao vivo na TV. Estávamos ansiosos para que alguma empresa nos processasse, pois seria uma plataforma de divulgação e debate. Entretanto, quatro anos depois, a Câmara retirou a queixa. Provavelmente julgaram que perderiam ou que teriam que responder às perguntas que não queriam sobre suas práticas nefastas de negócio.
Nos Estados Unidos, passar-se por outra pessoa acaba sendo interpretado como um dos direitos de livre expressão – o direito à paródia. Em outros países como na França, no entanto, onde a lei é mais restritiva nesse aspecto, pessoas foram presas por se passarem por políticos.. E, como em todo lugar, a aplicação da lei pode variar de acordo com quem está envolvido e quais interesses a ação mobiliza.
O livro publicado em inglês, em 2010, Pequenos atos de resistência: como a coragem, a tenacidade e a engenhosidade podem mudar o mundo, de Steve Crawshaw e John Jackson, apresenta várias estratégias de sátira política que foram empregadas em contextos muito opressivos, nos quais pessoas corriam riscos reais e não podiam revelar suas identidades. Em certas situações, é preciso ser muito cuidadoso e judicialmente amparado, pois é importante continuar a fazer o que fazemos, mesmo que signifique apenas molhar os dedinhos um pouco na água e sentir a repercussão. É preciso agir e pensar como agir. Inclusive no contexto brasileiro atual, com um novo governo especialmente repressivo, no qual pode parecer difícil imaginar as consequências.
Nos últimos dois anos, temos tentado descobrir como lidar com o novo contexto de ascensão da extrema direita. Um mundo pós-mídia e pós-notícias, em que déspotas podem falar diretamente às pessoas através do WhatsApp e do Facebook. Um mundo onde a mídia tradicional ou qualquer outra mídia não exerce mais seu antigo papel diante de um enorme segmento da população. O que podemos fazer hoje? Embora ainda consigamos trabalhar com questões específicas, como atuar em uma agenda política mais ampla?
É difícil avaliar exatamente qual foi o papel de nossas ações anteriores. O que nós vínhamos fazendo era dar à mídia tradicional boas desculpas para cobrir assuntos realmente importantes. De fato, conseguimos muita atenção da mídia, o que no campo de batalha da indústria da propaganda importa muito. Percebemos que nosso trabalho funcionava basicamente como uma espécie de agência de Relações Públicas gratuita, em prol de cada causa. Nesse ponto tivemos êxito porque penetramos esferas que o movimento ativista tinha dificuldade de acessar.
Ao que parece também tivemos sucesso como palhaços. É empoderador e energizante para as pessoas que são parte do movimento e trabalham organizando informações, abrindo processos e mobilizando cidadãos poder assistir às organizações e a seus pares transformados em bobos.
Duas semanas depois de nossa atuação na Câmara de Comércio dos Estados Unidos, eles anunciaram que haviam mudado de posição. Mas isso não aconteceu apenas porque colocamos pressão sobre eles por meio do espetáculo na mídia. Aconteceu porque ativistas trabalhavam por muito tempo e de muitas maneiras tentando convencê-los a apoiar a lei sobre a mudança climática. Com conversas dirigidas a companhias participantes da Câmara no intuito de fazê-las desistir de sua participação, conseguiram que a Nike, por exemplo, deixasse a Câmara de Comércio dos Estados Unidos. Ao final, essa vitória pertence a muita gente.
Por outro lado, é difícil evitar a sensação geral de que estamos perdendo. Afinal, as coisas parecem continuar iguais ou até piores. Mas o jogo ainda não acabou. Se perguntássemos àqueles que lutaram pelos direitos civis se achavam que estavam vencendo, boa parte responderia que não. Alguns tinham certeza de que estavam perdendo. Eram presos, apanhavam. Embora nada parecesse ser justo ou estar certo, eles continuavam no jogo, até que um dia a lei dos direitos civis foi aprovada.
Assim, sobretudo hoje, é preciso ser mais desobediente do que nunca. Imaginar criativamente maneiras de como resistir. Uma estratégia possível é nos tornarmos inúteis para o sistema. Atrapalhar. O grupo espanhol Yomango costumava furtar lojas como ato político, pois, para eles, o furto contrapõe-se à mercadoria. Furtar é entendido como um ato anticomercial. Diante das tentativas de restrição da autonomia das pessoas em todo o mundo, ainda espero que possamos impedir e mudar o rumo das coisas. Falhas podem ser positivas no mundo do ativismo. Muitas vezes falhamos, mas esperamos com esperança que nossas ações falhas contribuam para uma ampla vitória.
Igor Vamos
Artista multimídia membro do The Yes Men e professor associado de artes da mídia no Rensselaer Polytechnic Institute. Em 2000, ele recebeu o prêmio Creative Capital na disciplina de Campos Emergentes.
Como citar
VAMOS, Igor. Táticas para dizer não! PISEAGRAMA, Belo Horizonte, n. 13 [conteúdo exclusivo online], maio. 2019.
Tradução de Luiz Alves